Em Agosto de 2008, a Bispa Joaquina Filipe Nhanala fez história ao se tornar na primeira mulher eleita para o episcopado Metodista Unido em África. Ela lidera a Área de Moçambique.
Em homenagem ao mês da História da Mulher, Nhanala reflecte sobre o Metodismo Unido em Moçambique - seus desafios e conquistas - e como ela tem gerido as múltiplas crises que confrontam sua área episcopal hoje. Algumas respostas foram editadas por questão de espaço e clareza.
Desde a sua eleição para o episcopado, a Área Episcopal de Moçambique enfrentou vários desafios. Quais são os maiores que já experimentou?
Pobreza, alto desemprego, analfabetismo, falta de infra-estrutura adequada que garanta saúde para a população, imoralidade, violência doméstica e a proliferação de igrejas que falam mais da prosperidade do que da própria boa nova de salvação. ... Associados a esses desafios, também temos conflitos armados e desastres naturais. Tais fenómenos pioram a vida de nosso povo, forçando-o a viver na periferia da periferia - ou seja, tornando-o mais vulnerável.
Quais são as soluções possíveis para esses desafios?
Procuramos estimular as famílias a aproveitarem as diversas oportunidades que a igreja oferece, a fim de se equiparem-se com habilidades para enfrentar os desafios do dia-a-dia, capacitando-as a criar o auto-emprego para geração de renda. Com a ajuda de nossos parceiros, criamos projectos de… agricultura, electricidade, serralharia, carpintaria e outros para as comunidades, com foco maior nos jovens. Temos também um projecto de construção de casas para alugar, com a esperança de que, um dia, isso alivie o peso sobre os membros e, de alguma forma, melhore a vida da igreja e até do clero.
Em 1992, foi assinado o Acordo Geral de Paz em Roma entre a RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana) e o governo da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique). Que bem este acordo trouxe ao povo moçambicano?
O Acordo Geral de Paz trouxe esperança ao povo moçambicano. Trouxe a possibilidade de as pessoas reiniciarem suas vidas após 16 anos de guerra civil. Também trouxe um ambiente em que as pessoas foram capazes de perdoar a si mesmas, mesmo sem a outra pessoa pedir perdão. O (acordo) permitiu que os deslocados internos e externos, ou rebeldes, pudessem regressar à vida familiar. … Parecia estar-se no fim de dois conflitos consecutivos: o que culminou na celebração da independência que não durou muito (1975) e o que marcou o fim da guerra civil (1992).
O que o acordo de paz fez à igreja em Moçambique?
Naturalmente, abriu espaço para a igreja cumprir sua missão de pregar o evangelho com palavras e obras. A igreja cresceu numérica e qualitativamente. A igreja encontrou espaço, mais uma vez, para pregar o evangelho do perdão, ensinar, baptizar e realizar obras socialmente benéficas para as comunidades. O (acordo) permitiu à igreja ser e agir como uma igreja em quase todo o país.
Desastres naturais como secas, cheias e ciclones acontecem com frequência em Moçambique. Que mensagem a igreja tem compartilhado com seus membros e a sociedade?
Só nos últimos cinco anos, o país foi assolado por seis ciclones de magnitudes avassaladoras (Dineo, Idai, Kenneth, Eloise, Chalane e Guambe). Em tempos de desastres naturais, a igreja tem, mais uma vez, pregado o evangelho de cura e esperança... Tem ajudado, compartilhado e encorajado sobreviventes a se beneficiarem dos meios disponíveis que a igreja tem no país, e daqueles que recebe de seus parceiros, como a Comissão Metodista Unida de Socorro e… conferências de Missouri, Nova Iorque e Alemanha. A igreja busca fazer o bem por meio de provisão, terapia e cura para sobreviventes de desastres naturais.
Os membros da igreja no país responderam de maneira fantástica. Praticamente, eles vivem e mostram o que Cristo faria ao ver as pessoas sofrendo. A igreja fornece alimentos, roupas e material de higiene e de construção. Outros ainda acolhem sobreviventes que ficaram desabrigados. O apoio que a igreja tem fornecido é… moral, psicológico e espiritual.
Em resposta a desastres naturais, o que a igreja está fazendo no momento?
Uma das coisas que pensamos ... boa para incorporar, além da provisão de meios de subsistência e abrigo, é a educação da igreja e das comunidades sobre a importância de observar os avisos e sinais de informação compartilhados pelo governo para a prevenção dos efeitos dos desastres naturais. Temos, em alguns lugares da nossa área episcopal, equipes de socorro. Essas equipes são de resposta treinadas que, por sua vez, treinam as comunidades nos níveis de base na prevenção e mitigação de desastres.
Qual é a extensão geográfica de sua área episcopal e como tens gerido todas essas crises?
Nossa área episcopal é geograficamente grande. Abrange quatro países, nomeadamente: Moçambique, África do Sul, Suazilândia e Madagáscar. Portanto, às vezes é necessário viajar para supervisão e orientação. Graças a Deus, o trabalho do Senhor no terreno está indo bem ... com a colaboração de servos comprometidos com a missão da igreja. Embora em alguns lugares tenhamos que trabalhar com a ajuda de tradutores, a chama do evangelho está acesa e muito forte.
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Moçambique é um país da África Austral, rico em recursos naturais. Achas que essa bênção está se tornando prejudicial por causa do surgimento de conflitos armados?
Falar sobre conflitos armados em Moçambique é uma realidade. Neste momento em que falamos, no norte e no centro do país, há irmãos e irmãs que estão sofrendo com esses conflitos. Um conflito não apenas mata e desloca pessoas; ele (também) destrói todo o tecido humano e psicológico. Essa destruição não é reconstruída simplesmente com o fornecimento de casa, roupas e alimentos. Aqui, tanto a Igreja como toda a sociedade viva do país são chamadas a agir na busca de soluções terapêuticas que acompanhem outros meios de cura para reavivar ... os filhos de Deus.
Como está a igreja nas áreas afectadas por conflitos armados?
O conflito não escolhe as vítimas. Nossos membros nas zonas de conflito estão directamente afectados. As famílias pastorais nomeadas para lá também estão afectadas. Houve lugares onde tivemos que remover os pastores para salvar suas vidas. Naturalmente, com um êxodo forçado como este ficamos sem igreja nas zonas de conflito, o que é muito lamentável.
Na sua opinião, quais são as causas básicas por detrás destes conflitos?
São dois tipos de conflitos com protagonistas diferentes. Um tem a ver com a discórdia em relação aos resultados das eleições presidenciais no país. Associado a isso, houve uma divisão dentro do maior partido de oposição política do país, a Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO). … A chamada Junta Militar da RENAMO… semeia dor e terror na zona central. Em segundo lugar, o conflito… é perpetrado na parte norte de Moçambique, particularmente na província de Cabo Delgado, que já causou milhares de mortos e deslocados. Tem muitas faces, e uma delas é religiosa porque os membros do Al-Shabaab estão envolvidos.
As razões para este conflito são conhecidas?
As razões por detrás deste conflito no norte do país estão potencialmente ligadas à riqueza natural existente em Cabo Delgado. A bacia do Rovuma e as águas profundas, sob gestão nacional, são fontes de grandes jazigos de petróleo e gás, com milhões de metros cúbicos a explorar. É também em Cabo Delgado que se encontram pedras preciosas de interesse internacional e económico. Assim, Cabo Delgado passa a ser um pólo de atracção de abutres com interesses perversos. Outra face do conflito é atribuída aos insurgentes que, infelizmente, não querem ... sentar-se à mesa de negociações com o governo. Enquanto as negociações não estão acontecendo, essas forças armadas desconhecidas matam, saqueiam, queimam casas, destroem todo o tipo de infra-estruturas, sequestram e violam sexualmente as populações indefesas.
Qual tem sido a acção da igreja nesses conflitos?
A igreja tem activamente providenciado socorro nos lugares onde os sobreviventes encontraram refúgio. Tem apoiado famílias que foram vítimas / sobreviventes dos conflitos armados. Em Cabo Delgado, por exemplo, através de iniciativas locais, recolhemos recursos financeiros e materiais que foram canalizados para os beneficiários. … Parceiros como a UMCOR e a Conferência Anual do Missouri têm estado connosco na procura de soluções para mitigar o sofrimento dos nossos irmãos e irmãs em Cabo Delgado.
O que acha que está faltando ainda na resolução de conflitos?
A falta de um diálogo sério e aberto entre as partes contribui para a eclosão dos conflitos armados. O diálogo entre os seres humanos, por mais diferentes que sejam em suas opiniões, é importante porque só por meio do diálogo as pessoas se entendem. As armas nunca resolveram nossas diferenças de opinião.
Falou anteriormente sobre os desafios. Que medidas a igreja tem tomado para resolvê-los ou minimizá-los?
Um de nossos investimentos está focado na capacitação de membros da igreja e comunidades dentro da área episcopal. Nós encorajamo-los a abraçarem as ofertas e oportunidades que a igreja oferece. … Temos, por exemplo, programas de empoderamento voltados para mulheres, raparigas, crianças e jovens, pois representam os estratos mais vulneráveis. Ao nível das conferências, tentamos implementar projectos de sustentabilidade para arrecadação de fundos que possam aliviar e reduzir a pobreza.
Temos infelizmente graves problemas no sector de saúde materno-infantil, onde, ainda hoje, continuamos com altas taxas de mortalidade.
Na área da educação, temos escolas em todos os níveis de ensino onde contribuímos com a formação de uma nova geração de líderes que responderão positivamente aos atuais e futuros desafios globais. Equipamos a igreja e a sociedade em geral com ferramentas e habilidades com as quais podem criar o auto-emprego e ou busca-lo no mercado.
Sambo é o correspondente lusófono em África para as Noticias da Metodista Unida. Contato com as notícias: Julie Dwyer, editora de notícias, [email protected]. Para ler mais notícias da Metodista Unida, assine os resumos quinzenais gratuitos.